20.1.07

ὦ παῖ παρθένιον βλέπων

[Pátroclo e Aquiles]

ὦ παῖ παρθένιον βλέπων
δίζημαί σε σὺ δ'οὺ κλύεις
οὐκ εἰδὼς ὅτι τῆς ἐμῆς
ψυχῆς ἡνιοχεύεις

(Anacreonte, frg. 15 Page)

16.1.07

Noli me tangere

[Duccio - Noli me tangere]

Não me toques. Não lho disse. Ou disse. Lançava-se sobre o meu corpo mole. Faz de mim o que quiseres. Já contei isto. Não faz mal. Faz. Faz de mim o que quiseres. E se eu não quiser nada. Não lho disse. Se calhar disse. Disse. Hoje não. Estou cansado. Parece mentira. Mas foi o que eu disse. Portanto disse. Que não queria nada. Entre gemidos. Ofegava-me no pescoço. Amanhã. Amanhã também vais estar cansado. Não. Amanhã prometo que não estou. Amanhã não vou aparecer. Isto não lhe disse.

E no entanto

[Delacroix - Tasso no hospício]

Começo a perder a esperança de que algum dia. Se alguma vez. Nunca tive esperança. Não se pode perder o que não se tem. De que algum dia acorde. Às vezes parece que. Não sei. Se calhar um dia. Só depende de mim. E no entanto.

13.1.07

Data

[Caravaggio - A ceia de Emaús]

à memória do Rui

Não sei se faz sentido comemorar os teus aniversários. Ainda que o tenha vindo a fazer desde que morreste. É que nunca dei grande importância a aniversários. Nem ao meu. Só a saudade me impele a lembrar-me de ti com mais veemência nos dias onze de janeiro. Mas dói-me mais a data da tua morte.

5.1.07

Quase parei

[Picasso - Rapaz com cachimbo]

à memória do Rui

Encontrei-as. Assim. Sem que as procurasse. Já as pensava perdidas para sempre. Mas não. Espaço para mais livros. Talvez em cima daquele armário. No meio do pó. Dentro de uma capa de plástico amarrotada. E havia outras duas fotografias tuas. Uma imprimimo-la no meu antigo quarto. Lembras-te. Toda negra. Depois apareces tu, meia cara iluminada. Havia também aquela em Fátima. Claro que te lembras. Sabes que não consigo voltar lá. Nem ao. Tu sabes. E aquela que tiraste à Eunice Muñoz. E aquela à A. Tão bonita. E depois aquela outra tua. Olhei para elas e doeu tanto. Não foi no coração. Foi um aperto terrível na garganta. Um murro no tórax. Pus no quadro de cortiça aquela tirinha tirada na máquina automática. Quase parei de respirar. Já lá vão quatro anos. E ainda dói tanto.