13.5.08

Maré baixa

[Bosch - Santa Inês e o doador (pormenor)]

É uma solidão feita de lama amassada no recolher da esperança. A parede negra do fumo dos teus cigarros, um bolor entediado escorrendo dedos de medo. E eu os olhos despejados no dia pastoso que me esmaga o peito. Do copo o cheiro da morte que vem hoje amanhã não sei. Porque enquanto esfrego a mesa com o olhar e penso no dia na hora em que tu e eu. Descem-me as horas sobre a cabeça e eu vou-me dormindo à espera de que o dia passe. Este e o outro. O de amanhã. Porque enquanto os dias não deixarem de passar.

1 comentário:

da. disse...

E ainda assim..só porque existe um prazer tantas vezes inconfessado no que há para além da solidão, é que se escreve sobre o próprio ser-para-si ensimesmado no tempo que dura sobre si mesmo. Os dias passam, o olhar nas mesas, o tu e o eu...mas só este último reduto da existência não passa e parece ter o peso da infinitude: o de haver em nós uma parte que sinta a solidão profunda que significa simplesmente «ser».