Impresso de 1726, achado na Biblioteca Nacional, com a quota H.G. 23767//7 P, encadernado entre outras coisas bem menos interessantes, posto que mais importantes. Transcreve-se respeitando ortografia e pontuação. Em episódios.
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«Esta me obrigou a acharme em varias montarias, que se fizeraõ no termo desta Cidade, para evitar o damno, que todos os dias padeciaõ os Camponezes; mas naõ tiveraõ o effeito, que se esperava estas diligencias, porque apenas o poderaõ affugentar para a parte de Jerusalem, onde emboscado nos matos circunvisinhos, sahia a fazer os mesmos insultos nas estradas, e nos campos. Só a figura deste animal impunha medo aos que a viaõ: a violencia com que acometia, desanimava o valor dos que o buscavaõ; e como todos na sua visinhança tinhaõ o perigo por certo, todos procuravaõ vello, mas de longe; e assim se naõ podia reconhecer a sua especie.
Entendia-se ao principio, que era algum Leaõ, que tinha sahido das terras da Hircania, obrigado pela indigencia do sustento: a outros lhes parecia ser Urso; porem a grandeza do seu corpo desmentia estas opinioens; porque era mayor, que nenhuma destas feras. Depois de morto nos confins de Jerusalem, se me mandou o seu retrato, de que vos envio a copia. Por ella vereis, que naõ tem semelhança com algum dos animaes, que nos descreve Plinio, e retrataõ Gesnero, e Aldrovando. Naõ faltou quem quizesse persuardirme, que era Grifo; animaes, que ainda que façaõ grande figura nos brazoens, tenho por taõ fabulosos, como a Ave Fenix. Tambem houve quem dissesse, que era Serpente, ao que eu me inclinava mais, porque como estas naõ multiplicaõ a sua especie, cada uma póde ter differente fórma; mas he necessario capacitarme primeiro, que ha Serpentes. Bem me lembro de haver lido, que produzio a terra huma, depois do diluvio de Deucalion, a que se deu o nome de Pithon, cuja prodigiosa grandeza, e deploraveis estragos referem os Poetas antigos, decantando o triunfo de Apollo, e a origem dos jogos Pithios; mas tambem sey, que os Naturalistas, comprovando a sua thesi com a significaçaõ da palavra Pithon, que na lingua Grega significa podridaõ, dizem, que a origem desta fabula foraõ os grossos vapores, e densas exalaçoens, que sahiraõ da terra depois daquele diluvio, e faziaõ morrer infinito numero de Povo; com que ja la vay esta Serpente, e este exemplo.»
[continua]
Entendia-se ao principio, que era algum Leaõ, que tinha sahido das terras da Hircania, obrigado pela indigencia do sustento: a outros lhes parecia ser Urso; porem a grandeza do seu corpo desmentia estas opinioens; porque era mayor, que nenhuma destas feras. Depois de morto nos confins de Jerusalem, se me mandou o seu retrato, de que vos envio a copia. Por ella vereis, que naõ tem semelhança com algum dos animaes, que nos descreve Plinio, e retrataõ Gesnero, e Aldrovando. Naõ faltou quem quizesse persuardirme, que era Grifo; animaes, que ainda que façaõ grande figura nos brazoens, tenho por taõ fabulosos, como a Ave Fenix. Tambem houve quem dissesse, que era Serpente, ao que eu me inclinava mais, porque como estas naõ multiplicaõ a sua especie, cada uma póde ter differente fórma; mas he necessario capacitarme primeiro, que ha Serpentes. Bem me lembro de haver lido, que produzio a terra huma, depois do diluvio de Deucalion, a que se deu o nome de Pithon, cuja prodigiosa grandeza, e deploraveis estragos referem os Poetas antigos, decantando o triunfo de Apollo, e a origem dos jogos Pithios; mas tambem sey, que os Naturalistas, comprovando a sua thesi com a significaçaõ da palavra Pithon, que na lingua Grega significa podridaõ, dizem, que a origem desta fabula foraõ os grossos vapores, e densas exalaçoens, que sahiraõ da terra depois daquele diluvio, e faziaõ morrer infinito numero de Povo; com que ja la vay esta Serpente, e este exemplo.»
[continua]