أَفَأَنْتَ تَهْدِى الْعُمْىَ وَلَوْ كَانُوا۟ لَا يُبْصِرُونَ
e não podes tu guiar os cegos mesmo não vendo eles?
Alcorão, 10:43
A tosse. Todas as manhãs. Como se me arrancasse as tripas. Assim. E me enfiasse os braços na boca. Os braços. E me fosse arrancando os pulmões. Uma tosse com braços. Veja lá. Mas ouça. Se o senhor me pudesse ouvir de manhã. Naqueles tempos. Não agora. Agora não fumo. Nada. Não custou nada. Três maços por. Acredite. Dizia eu. Se me pudesse ouvir de manhã. Esganado no fumo da noite e do dia de ontem. Grasnando aflito fechado na casa de banho. A cada ataque era um naco de dor e de vómito. A mãe enfiava os lábios no buraco da fechadura e rosnava ladainhas de nãodeixesdefumarnãos com susto zangado. Leoa a quem leão novo abocanha os filhos. E só passava quando acendia outro. Quando saía de casa. Até lá arrojava-me em espasmos tussíferos até à cozinha. Abria a boca e tentava engolir um naco de pão com. Sei lá. Doce manteiga queijo. Tanto faz. Porque o vómito era sempre igual. Estrangulado. Até às lágrimas. Sustinha a respiração. Sabendo que não o matava. Mas tentava. Pensava em coisas bonitas. Embora a madrugada não me seja propícia a coisas bonitas. Sabe que um dia quis ver o nascer do Sol. Fiquei profundamente desiludido. Mas ele tornava e às vezes não conseguia contê-lo. Depois gemia até-logos e saía esmagado pela fúria aflita dos lábios da mãe. Vinte anos. Quer dizer. Vinte e dois ou vinte e três. O senhor percebe o que quero dizer. Ou mesmo vinte e cinco. Era tão novo. Agora olhe para mim. Olhos cansados. Os cabelos cor de. E o cheiro. Sabe. Não o suportava. Eu. O cheiro da cinza podre da noite anterior. E vinha isto a propósito de. Sim. Já sei.
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