19.4.09

the carpeted stairs of terror

[Caravaggio - João Baptista]
...
(carefully climbing carpeted flight after

carpeted fight. .. in stillness,climbing
the carpeted stairs of terror)
...
e. e. cummings

Foi quê. Há vinte anos. Ou menos. Não sei. Foi há tanto tempo. Lembras-te. Os teus olhos pingavam ao meu lado. Ao lado. Não me tocavam. Em mim nunca pingavam. Nunca. Nunca entendi. Se me podias ter dito não. Porque é que não me disseste não. Porque é que em vez disso me chupaste as noites e os dias e o. Lembras-te. E depois que querias que acontecesse. As coisas que tu me fazias. Queres uma toalha. Não. Quero que desapareças que me deixes os pensamentos que vás para o. Quando podias ter continuado a fingir que eu não estava ali. Quando podias não ter entrado no táxi bêbedo ao meu lado quando podias não ter dito dá-me um beijo bêbedo se fores capaz. Bêbedo. Quando podias não me ter levado para aquele canto escuro e quando podias não te ter sentado ao meu colo. Daquela maneira. E depois. Tu sabes. Não me faças dizer aqui em frente as estas pessoas aquilo que me fizeste na primeira noite. Arrojando-te ao meu colo no castelo de São. Já era madrugada e cheiravas a cerveja rasca. E eu tinha quê não sei. Vinte. Ou menos. Não sei. Foi há tanto tempo. Podias ter continuado a olhar-me de longe e a rosnar-me olás indiferentes. Em vez de. E eu não te teria provado a pele e os cabelos e os teus cabelos compridos e eu dizia-te que não os cortasses e a minha pele rasgada na lixa da tua cara rude. Mas provei. Naquela noite e na outra e na outra e em todas as outras noites medonhas. E os meus dedos esmagados no látego dos teus cabelos e a pele a minha pele queimada. E eu chegava a casa e olhava-me ao espelho e passava a mão nas bochechas no queixo arranhado e vinha-me o teu cheiro o teu cheiro a leite azedo. E depois era um murro na barriga. Uma garra que me esventrava. Porque cada vez era sempre a última e eu sabia que não te voltaria a ter os cabelos e as mãos grossas na boca. Nem o perfil ondulante contra a luz feia do candeeiro da rua. A tua sombra pequena em arco e as mãos a entornar os boxers difíceis primeiro de uma perna depois da outra já está até se afogarem bêbedos no chão negro do quarto. E depois cuspias o corpo enfadado ao lado do meu e rebolávamos para dentro do buraco a meio da cama. Sem nos mexermos. E às vezes chegavas lá já a dormir e se tivesse havido um tempo bom. Se aquilo fosse só o morrer da paixão mas não era. Foi sempre assim. Foi assim na primeira noite quando me disseste adeus e não te vi durante. Durante muito tempo. E depois voltaste. Uma vez e outra outra outra outra. Porque nunca era a última. Havia sempre mais uma.

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