21.6.06

Tigre!

[Münch - Mulher vampiro]

Nunca lhe soube o nome. Nem quem era. Via-a na noite. Ao longe. Olhava-me fixamente. Desafiadora. Poderosa. Eu desviava o olhar. Agarrava-me ao cigarro. Aflito. Quem és tu. Enchia a sala. Não precisava de a ver para saber que estava ali. Sentia-a. Um abraço sufocante. Depois varria a sala com o olhar. Até a encontrar. Sempre ao longe. Cravando os olhos em mim. Não a queria ver. Queria apenas ter a certeza de que estava ali. Saber onde estava. Para me esconder.

Que vibração era aquela. O meu coração. A música. Não sei. Dançava. Nunca gostei de dançar. Mas ali no meio da multidão era difícil ser visto. Fugia-lhe. De que tinha medo. Não sei. Sei. Sei. Às vezes sentia um aperto. Um roçar sôfrego. Era ela. Nem sempre a pista de dança era um lugar seguro. Fugia. Enfiava-me na casa de banho. Uma vez quando abri a porta para sair estava ela à minha espera. Muda. Gelei. Hesitei uns momentos e fugi. Seguiu-me com o olhar enquanto eu me escondia no meio da multidão. Não se mexeu. Para quê. Era com os olhos que me agarrava.

Uma noite atacou. Não lhe tinha sentido a presença. Ou melhor, só a senti quando já estava sentada ao meu lado. Não sei o que terá feito para se esconder. A verdade é que não dei por ela. Olhava-me sorridente. Agora parecia humana. Alívio. Desta vez não tinha medo. Não se apresentou. Simplesmente começou a falar comigo. Como se nos conhecêssemos desde sempre. Trocámos bebidas. Fumámos cigarros. Enfiados no sofá. Ela aproximava-se perigosamente. Sentia-lhe o hálito alcoólico. Excitante. Já sei do que tinha medo. Agora queria fugir. Mas não conseguia. Não era capaz. Tomava-me um pânico desesperado. Fico doido com um hálito com um suave travo a álcool. Não me consigo controlar. Ela sabia-o. De certeza. Lançava-se sobre mim. Bafejava-me. Felina. Lugar comum. Mas ela era felina. E eu desisti. Ébrio. Entreguei-me. Não me controlo. Língua com língua. Um desespero ardente. Apertava-a contra mim. Com violência. Percorria-lhe o corpo palpitante. Quem és tu, o que queres de mim. És lindo sabias. Não não sabia até tu apareceres. Há tanto tempo que te desejava. E eu fugia de ti. Eu sei, és um tolo.

Vimo-nos mais algumas vezes. Sempre à noite. Fora-se o medo. Agora olhava-a como a todas as minhas vítimas. Desprezo. Sugara-lhe a alma. Deitava fora as sobras. Não me compadecia do seu olhar desesperado. Fugia. Mas agora por repulsa. Obtivera o que queria. Ou o que achava que queria. E ela olhava-me implorante. E eu fugia. Não queria mais. Uma noite chegara. Adeus. Continuava à procura da plenitude. Viria a senti-la pouco tempo depois, numa noite no Frágil. Mas naquelas noites não a tinha ainda encontrado. Tigre que mata a presa e não a come porque não é aquilo que procura. Tentou mesmo dar-me o número de telefone. Recusei delicadamente. Não sei se chorou. As luzes da discoteca cegam-me. Não era aquilo que eu procurava. Nunca lhe soube o nome. Nem quem era.

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