14.4.06

Já não era tempo

[Redon - Barco vermelho com vela verde]

a C.

Já não era tempo de amar. Os dias da paixão há muito se tinham desvanecido. Tudo parecia agora um equívoco. Gostava de ti, é certo. Mas já tinha passado aquele incêndio que me consumira durante tanto tempo. Não partilhávamos quase nada. Eu achava que o ócio sem as letras era sepultura em vida. Tu veneravas a imagem, passavas bem sem livros. De que podíamos falar? Não me lembro de haver um único interesse que partilhássemos. Já não havia sequer a louca atracção física, que tudo compensara no início. Apesar disso eu não tinha força para dizer basta. Inércia. Chegáramos àquela fase dos longos silêncios pesados, de quem já nada tem para partilhar. Eu desistira, mas não o assumia. Tu parecias ter ainda esperança, mas esbarravas na minha indiferença. Arrastávamo-nos, sem solução nem fim. Até que um dia te fartaste da minha apatia. E também tu desististe. Já não era tempo.

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