24.4.06

O desejo

[Boudin - Costa de Portrieux]

a J.

Deitados, de costas, nas areias finas como farinha. Olhávamos as poucas estrelas e não dizíamos palavra. Era apenas a terceira vez que nos víamos. Mas era como se fosse de novo a primeira. Silêncio. Sabíamos o que estava no coração de cada um. Perto, demasiado perto, o marulhar das ondas, que quase nos lambiam os pés descalços. Não se via quase nada. Sentíamos apenas a presença um do outro. Sabíamos o que queríamos. Mal nos conhecíamos. Sabíamos, porém, que naquele momento não podíamos conceber a vida um sem o outro. Era arrebatador. Não ousávamos confessá-lo. Bons amigos, com medo de deitar tudo a perder com um gesto mais imprudente. Deitados de costas, olhando as estrelas esparsas, cobertas por uma neblina densa que nos humedecia os cabelos e a roupa. Sem dizer palavra. Desejando-nos intensamente.

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