28.8.07

A mãe das rochas

[Caspar David Friedrich - Recife]

آخر الذوا الكي
o ferro quente é o último recurso
(provérbio libanês)

Era aquela hora em que o Sol malha as cabeças com martelo furioso. Subindo suado as rochas ressequidas. E o cheiro a alga e a mar e a morte. A sua. De cada vez que o pé resvalou numa pedra solta. E o corpo estremeceu. Ai ai. E uma mão lançada mais acima e o corpo colado à pedra. É que não podia morrer enquanto não chegasse aqui. Por isso não deitou os olhos no abismo. Manteve-nos no ar. Aqui. Na rocha mãe. Mãe de todas as outras. Mãe. Desde miúdo lhe chamou assim. Aquela é a mãe das rochas. Porque dela parecem nascer todas as outras. Assim. Rolando devagarinho. Uma depois da outra. Saindo de dentro da mãe. Tremenda parede de pedra. E lá em cima. Lá em cima fica a mãe. Serena. E agora já pode deitar os olhos no abismo. Porque já chegou. À mãe das rochas. E o vento é tão forte. E os pés mal acham sítio onde pousar. Lá em baixo a praia pequenina. Não tem areia. Só pedra negra. Depois caiu. Beijando com o seu sangue uma a uma as filhas da mãe das rochas. Não tropeçou. Nem foi o vento que o soprou. Caiu.

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