No es el miedo a lo desconocido lo que me retrae, aunque actualmente me acosa una picazón en la mano derecha, aguda en el dedo mayor, y una suerte de entumecimiento, como si un agente sobrenatural me estorbara, para no dejarme escribir.
Adolfo Bioy Casares, Historia prodigiosa
Depois levantei-me e pus-me de pé em cima da cama os olhos lançados ao tecto. Não sei de onde me veio aquela força. Se do meu coração parado. Porque ele estava parado. Eu punha a mão no peito e nada. Nem um tum tum tum tum. Silêncio quieto. E um frio tremendo que me invadia os membros e os dedos estavam da cor da cera. Eu estava morto. Mas via e ouvia e cheirava. E punha-me de pé e agora não tinha medo. Daquilo lá em cima. Daquele zumbido rido que me enchia os ouvidos mortos. Do cheiro a cor de laranja ondeando o ar empoeirado.
Depois reparei que não respirava. Porque o pó já não me sufocava e o meu peito estava parado. Eu estava morto. Ainda que para o confirmar a minha mão se erguesse e percorresse o peito à procura de um tum tum tum tum de um vai-e-vem de um estou vivo. Então estar morto é isto. Eu pensava que. Na altura eu ainda acreditava em deuses. Eu pensava que vinha um anjinho bonito e me pegava e me levava pelos ares até ao céu onde um senhor de barbas me punha ao colo e me dava um beijinho e depois me mandava para um recreio sem fim feito de nuvens. E afinal. É igual a estar vivo. Só que não há tum tum tum tum no peito nem nos sufocamos com pó nem temos medo.
Depois deixei de pensar na minha estranha morte e quis abrir a moldura de madeira. A porta do meu terror. Para ver o que estava lá em cima. Porque agora eu já não tinha medo. Um dia disseram-me. Não tenhas medo de nada: o pior que te pode acontecer é morreres: e da morte não devemos ter medo porque ela é certa. E eu já estava morto. Um morto não morre. Nada mais me podia acontecer. Portanto eu tinha de abrir aquela porta maldita.
Se eu pusesse o escadote em cima da cama. Já tinha pensado fazê-lo tantas vezes. Mas o medo. Medo de quê. De cair e morrer. Mas eu já estou morto.
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