27.8.07

A outra carta

[Leonardo da Vinci - Estudo]
I could be wholesome,
I could be loathsome,
I guess I'm a little bit shy,
Why dont you like me?
Why dont you like me without making me try?
(cantado por Mika)



Pegar num papel e escrever e dizer-lhe tudo o que me vai na cabeça no coração onde quer que esteja aquilo que me rouba os sentidos. Depois não lha mando. Porque eu não cometo duas vezes o mesmo erro. Humilhado uma vez. Não haverá segunda. Eu sei que ainda sou um miúdo. Treze anos mal feitos. Mas juro aqui e hoje. Não mais escreverei cartas de amor. A ninguém. Porque eu não vou passar outra vez por isto.

Carta de amor a não enviar mas a ser escrita na mesma
Olá. Tu sabes quem eu sou. Sim sou eu. André. Escrevi-te uma carta de amor. Lembras-te. Claro que te lembras. Viras-me a cara quando passo por ti. Nunca mais me disseste palavra. Olha. Eu sei que não sou bonito como os meus amigos. Sou gordo e tenho acne agressivo e óculos grossos e cabelo indomável. Acredita: um dia vai ser moda. O cabelo. E os óculos. Ser gordo não voltará a ser moda tão cedo. Mas um dia eu não serei tão gordo. Um dia, garanto-te, não terei acne. Um dia não serei feio. Juro. Não sei se podes esperar. Se queres. Porque sabes. Tu és tão bonita. E eu posso ser feio e gordo e ter acne agressivo e óculos grossos e cabelo indomável. Mas na verdade. Agora eu devia escrever alguma coisa que te mostrasse que apesar de tudo eu posso ser um bom namorado. Mas sabes. Agora que penso bem. Tens razão. Quem sou eu para te. Um miúdo borbulhento com três pêlos de barba. Treze anos mal feitos. Ainda se fosse bonito como os meus amigos. Tens razão em não me quereres. Quer dizer. Ainda não me disseste que não. Mas leste a minha carta olhaste para mim e riste e foste embora. É um não muito claro. Sem palavras. Mas não. E tens razão. Quem sou eu. Se fosse daqui a uns anos. Quando eu deixar de ser feio e gordo. Talvez então. Mas que importa. Tu não vais esperar. E eu também não. Sabes. A vida dá muitas voltas. Agora eu estou aqui. Gosto de ti. Quero-te. Sofro. Choro. Quero morrer. Mas ainda aqui estou. Amanhã não sei. Depois de amanhã não. Depois de amanhã já não estarei aqui. De certeza.

Adoro-te.
Ainda.
Adeus.

1 comentário:

Anónimo disse...

Gostei muito deste blog, que encontrei por acaso.
Boa continuação, visita também o meu que deixo. http://isabelmariados.blogspot.com/