10.2.06

A briga

[Cézanne - Banhistas]

à memória do Rui

Uma briga, lembras-te. Uns tipos num bar, e tu tinhas-te metido no meio. Partiste o nariz a um deles. Tinhas a camisola branca suja de sangue. Mandámos parar um táxi. Tínhamos ambos um ar pouco amigável. Sangue por todo o lado, em ti. Por detrás da barba de três dias desta vez não trazias o teu eterno sorriso trocista. Eu erguia-me do alto de botas com palaformas de mais de dez centímetros, atingindo assim perto de dois metros de altura. Coberto de negro, cabelo rapado, rosto inexpressivo. A estúpida pose habitual. O taxista pareceu hesitar. Não éramos clientes que lhe inspirássemos muita confiança. Para o Príncipe Real. Trocámos entre nós as poucas palavras do costume. O taxista lançava olhares nervosos pelo retrovisor. Nessa noite estávamos especialmente rudes no discurso, ainda excitados da briga recente. Ias mandando uma ou outra boca às raparigas, na rua. Lembras-te, o táxi passou então perto do Trumps, e o taxista rosnou "olh'òs lolós...". Entreolhámo-nos. O teu sorriso trocista estava lá outra vez. Explodi. Pedimos para parar. Eu não aguentava mais. Pagámos. Ríamos como dois miúdos. Uma tolice. Mas ríamos, e não conseguíamos parar.

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