10.2.06

Sonho

[Kandinsky - Improvisação 7]

à memória do Rui


E houve aquela madrugada em que ficámos à espera do primeiro autocarro. Na altura saíam do Saldanha. Nascia o dia. Vencidos pelo sono. Sentados na paragem. Eu encostei-me ao vidro. Esforço para não fechar os olhos. Procurava sempre manter a pose, em quaisquer circunstâncias. Lutava contra o sono, para me manter direito, encostado ao vidro da paragem. Tu não estavas preocupado com poses. Muito menos com o que os outros pudessem pensar. Tinhas sono. Faltava muito tempo ainda para o autocarro. Deitaste-te sobre as minhas pernas e dormiste. Havia quem passasse e olhasse. Eu sorria-lhes com desprezo, quando conseguia vencer o sono. Deixavam-se levar pelas aparências. Não é nada disso que estão a pensar, idiotas. Eles não percebiam nada. Nunca ninguém percebeu. Nem eu.

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