Fugia para o quintal. Ali me entretinha a brincar, ruidosamente, para abafar os gritos que vinham de casa. De vez em quando o barulho acalmava. Ouvia apenas o choro da minha mãe, ou não ouvia nada. Aliviava-se-me então o aperto no estômago. Mas normalmente era apenas uma pausa, uma trégua breve. Logo recomeçavam os gritos. O estrondo de louça partida. O choro. E recomeçava também eu a brincar ruidosamente, para não ouvir o horror. E pensava. Pensava que tinha à minha frente uma vida de choro, gritos, estrondo de louça partida. Felizmente era apenas a inocência da infância, a incapacidade de ver o futuro a longo prazo. Um dia a minha mãe disse-nos, com ar solene, que o meu pai ia sair de casa, que se iam separar. Recordo esse dia como um dos mais felizes da minha vida. Não mais haveria nem choro, nem gritos, nem estrondo de louça partida.
1 comentário:
Me gusta éste de Fuseli mucho.
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