[Klee - Som antigo]
À memória do Rui
Um dia eu estava já um pouco alegre, tinha bebido uns copos. Tu estavas sóbrio. Abraçámo-nos, já não sei porquê, e eu dei-te um beijo na cara. Eu gostava tanto de ti. Imediatamente foi como se a bebedeira incipiente tivesse passado. Fiquei desesperado. Tive medo de que levasses a mal. Ainda que a nossa amizade estivesse mais sólida de dia para dia, não sabia como reagirias a um gesto tão íntimo. Gostava demasiado de ti para poder sequer imaginar a possibilidade de perder a tua amizade. Pedi-te desculpas. Vivemos num mundo em que dois homens não podem exprimir a sua amizade a não ser com apertos de mão ou, em dias de festa, com um abraço. Mas eu dei-te um beijo na cara. Podias achar que se tratava de uma intimidade intolerável. Olhaste-me com aqueles teus olhos ingénuos, e disseste que não fazia mal, que éramos amigos, que estas coisas entre amigos eram normais. Não, não são normais. Mas tu, tu sim, tu eras extraordinário.
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