Inclinava-me aterrorizado para o vazio. Era uma cisterna. Ou um poço. Tinha grampos metálicos cravados na parede, que permitiam descer até ao fundo. Mas eu apenas me inclinava aterrorizado. Não me passaria nunca pela cabeça descer. Atraía-me, apesar do terror. Era sempre para ali que me dirigia, quando subia ao castelo, ainda antes de subir ao torreão, e admirar a espantosa vista sobre a cidade velha. Nunca havia ninguém no castelo. Sozinho avançava rapidamente em direcção à cisterna. Ajoelhava-me, e inclinava-me aterrorizado para o vazio. Não sei o que receava ver. Não sabia para que tinha servido. Tinha 12 anos, e uma imaginação fértil. Via soldados franceses, dos tempos das Invasões, amarrados, lançados lá para dentro, deixados a apodrecer naquela escuridão húmida. Vinha, de facto, um bafo frio e molhado lá de dentro. Não sei o que esperava ver. Um esqueleto, ainda dentro da sua farda. Ou um fantasma. Uns olhos brilhantes surgindo da escuridão húmida. Não sei. Mas inclinava-me, aterrorizado, atraído pelo abismo. Até que um dia pareceu-me entrever uma bota, que atribuí imediatamente ao soldado francês morto de fome e sede. Arrastei-me rapidamente para longe da entrada da cisterna, tomado de terror intenso, ergui-me, e corri o mais depressa que pude para fora do castelo. Não voltei durante anos.
24.1.06
A cisterna
Inclinava-me aterrorizado para o vazio. Era uma cisterna. Ou um poço. Tinha grampos metálicos cravados na parede, que permitiam descer até ao fundo. Mas eu apenas me inclinava aterrorizado. Não me passaria nunca pela cabeça descer. Atraía-me, apesar do terror. Era sempre para ali que me dirigia, quando subia ao castelo, ainda antes de subir ao torreão, e admirar a espantosa vista sobre a cidade velha. Nunca havia ninguém no castelo. Sozinho avançava rapidamente em direcção à cisterna. Ajoelhava-me, e inclinava-me aterrorizado para o vazio. Não sei o que receava ver. Não sabia para que tinha servido. Tinha 12 anos, e uma imaginação fértil. Via soldados franceses, dos tempos das Invasões, amarrados, lançados lá para dentro, deixados a apodrecer naquela escuridão húmida. Vinha, de facto, um bafo frio e molhado lá de dentro. Não sei o que esperava ver. Um esqueleto, ainda dentro da sua farda. Ou um fantasma. Uns olhos brilhantes surgindo da escuridão húmida. Não sei. Mas inclinava-me, aterrorizado, atraído pelo abismo. Até que um dia pareceu-me entrever uma bota, que atribuí imediatamente ao soldado francês morto de fome e sede. Arrastei-me rapidamente para longe da entrada da cisterna, tomado de terror intenso, ergui-me, e corri o mais depressa que pude para fora do castelo. Não voltei durante anos.
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