11.1.06

O medo

[Redon - O ciclope]

Decidimos tomar um dos caminhos secundários, em vez de seguirmos directamente para a "cratera". Era estreito e tortuoso, como deve ser qualquer caminho secundário de floresta. Em vez de subir em direcção ao cume, antes parecia rodeá-lo, ora descendo, ora subindo. Parecia ir dar a lado nenhum. Não lhe víamos o fim, não lhe víamos o início. A sensação de estarmos num mundo alternativo era cada vez mais intensa, à medida que avançávamos. Rapazes da cidade, não estávamos acostumados a estas paisagens campestres, apesar das nossas visitas regulares à "cratera". É que o caminho para a "cratera" era relativamente largo e directo, um caminho de inequívoca feitura humana. Este não. De tão estreito e irregular poderia perfeitamente ter sido feito pela passagem regular de um animal de grande porte. Receámos perder-nos. Para onde quer que olhássemos, árvores altas e mato denso. A luz era difusa, filtrada pelas copas altas. Não parecia haver qualquer vestígio de presença humana. Parecia nem haver vida animal. O silêncio opressor só era quebrado pelo leve restolhar das folhas. Falávamos pouco e baixinho, assustados, mas não tanto que pensássemos em voltar para trás. Estávamos convencidos de que tínhamos entrado numa zona proibida. Esperávamos a qualquer momento dar de caras com algum ser fantástico. De vez em quando ouvíamos a erva alta restolhar. Estacávamos, olhávamos assustados um para o outro e esperávamos. A uma certa altura pareceu-nos ouvir passos. Estávamos já a ficar bastante assustados. Qualquer pequeno ruído nos fazia parar. Qualquer estalido vindo do meio de um qualquer arbusto fazia-nos acelerar o coração. Então vimo-la. Estava debaixo de uma árvore. Num primeiro momento não lhe demos atenção, estava perfeitamente camuflada com a vegetação circundante, parecia um arbusto. Mas à medida que nos aproximávamos começou a tornar-se cada vez mais nítida. Uma cabana rudimentar, ou então um ninho gigante. Era feita de ramos e folhas. Suficientemente elaborada para não se poder confundir com um natural amontoado de ramos secos. Demasiado tosca para poder ter sido feita por homens. Não podia ter sido feita por um homo sapiens. Ou assim nos pareceu. Era suficientemente grande para abrigar um homem de estatura média. Mas não parecia feita por um homem. Pelo menos não por um homem convencional. Estávamos tomados de um intenso terror. Passaram-nos pela cabeça leituras recentes sobre seres fantásticos. Voltámos para trás, aterrorizados, passo rápido, sem trocar uma palavra até chegarmos ao caminho principal. Não voltámos à "cratera" durante muito tempo.

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