7.7.07

Aquilo que não se pode contar . 3 . O grito

[Bosch - Tentação de Santo Antão (pormenor do painel central)]

Contaré finalmente los hechos que he presenciado entre ayer y la mañana de hoy, hechos inverosímiles, que no sin trabajo habrá producido la realidad...
Adolfo Bioy Casares, La invención de Morel


que me povoam as noites e me assombram os sonhos vazios. Primeiro é só uma impressão vaga. Um peso no ar. Depois o cheiro. Intenso. Pegajoso. Quase quase doce. Mais nada. Não precisa de se mostrar. Está ali. Eu sei. É que o buraco na omoplata. Na esquerda. Vai-me doendo doendo. E só dói dói quando aquilo está ali. Tenho de o ver. Outra vez. Mesmo que isso signifique. Porque se o vir outra vez. Eu só queria arrancar este buraco na omoplata. Na esquerda. E viver. Se o vir outra vez. Talvez me mate. De vez. Depois acaba tudo. Este terror que me devora as entranhas. Se tu soubesses. Quando se torna maior aquele zumbido baixinho. E me vai arrancando devagar devagarinho os últimos fios de razão. E eu só queria que aquilo se calasse. Me deixasse dormir. Viver. Serpenteia-me a mão pela omoplata. A esquerda. Dói tanto agora. E este cheiro doce odioso. Mais forte mais perto. Por favor. Queria gritar queria

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