15.7.07

El cántaro

[Vermeer - Rapariga com jarro de água]

Insoportablemente soñé con un exiguo y nítido laberinto: en el centro había un cántaro; mis manos casi lo tocaban, mis ojos lo veían, pero tan intrincadas y perplejas eran las curvas que yo sabía que iba a morir antes de alcanzarlo.
Jorge Luis Borges, El inmortal

Sinto-me estranho. Desde aquela noite. Tão estranha. Porque eu não costumo. Tu sabes. Sento-me à ponta da mesa. Para não darem muito por mim. Depois baixo a cabeça. Para não me verem os olhos. E vou olhando e ouvindo. E quando falam comigo fico vermelho e gaguejo. Mas quase nunca falam comigo. É que não me vêem. Eu não quero. Porque eu consigo desaparecer. Apesar do meu metro e oitenta. Ninguém me vê. E eu posso ficar ali a noite toda. Rolando os olhos pela mesa. Parando aqui e ali. Sabes. A ver. E a ouvir. E se alguém me vê eu recolho o olhar. Como os caracóis. Quando lhes tocam nas antenas. Escondo-me e fico à espera. De que se esqueçam de mim. Depois deito outra vez os olhos para cima da mesa. Com cuidado. Não vá alguém roubar-mos.

Naquela noite eu não me sentei à ponta da mesa. Talvez porque. Não sei. Mudei tanto. Tão pouco tempo. Foi estranho. Não. Eu não estava estranho ainda. Foi depois. Quando deixei cair os meus olhos nos teus pela primeira vez. Então sim. Senti-me estranho. Um estranho doce. Ali estavas. E havia alguma coisa em ti. Não eram os teus olhos. Era aquilo que eu vejo neles. O teu mar.

No sé. Si alguna vez. Si algún día estaré en tus brazos. Porque a veces me parece que. Te lo digo otra vez. Te quiero tanto.

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