19.7.07

Aquilo que não se pode contar . 8 . Vermelho e laranja

[Bosch - São João Baptista no deserto]

Miro mi cara en el espejo para saber quién soy, para saber cómo me portaré dentro de unas horas, cuando me enfrente con el fin. Mi carne puede tener miedo; yo, no.

Jorge Luis Borges, Deutsches Requiem

Listas verticais. Vermelho e laranja. Fininhas. Com uns fios dourados pelo meio. Agora são cortinas pequeninas. Duas. Dantes eram cortina grande grande que fazia de porta. Lambe-as o Sol ao fim da tarde. De Verão. Quando da janela do scriptorium consigo vê-lo cair cair. Durante o resto do ano é frio. O scriptorium. E escuro. E não têm outra serventia senão proteger-me de miradas alheias. As cortinas pequeninas. Enchem-me o scriptorium de uma luz fraca fraquinha. Laranja. Ou vermelha. Não sei. Cor quente. E eu gosto de me sentar à secretária sem fazer nada. Banhado pela luz laranja. Ou vermelha. E se for depois de um dia de praia. A pele quente ainda a cheirar a mar. Gozar aquele calor laranja pachorrento. Ou vermelho. Tanto faz. Sem pensar em nada. A olhar para os meus livros. Para as recordações pregadas no quadro de cortiça. Porque estas não me doem. Tanto. E depois fogem-me os olhos para as cortinhas pequeninas e eu lembro-me.

Sem comentários: