15.6.07

Epistolário XX

[Bosch - Jardim das delícias terrenas (pormenor do painel esquerdo)]

breathe life into this feeble heart
lift this mortal veil of fear

take these crumbled hopes, etched with tears
we'll rise above these earthly cares

Loreena McKennitt


André ao seu querido Ρ.Α.

Eu respondo-te todos os minutos todos os momentos. Mesmo quando não respondo. Porque tu não deixas o meu pensamento. E a tua memória vive na minha. Por isso não te zangues. Embala-me sim nos teus braços de nada enquanto de novo me enredo em doce paixão. Platónica. Outra vez.

Eu não tenho medo. Não me digas que tenho medo. Porque olhar amar não tocar. Não não. Não tenho medo. Eu quero tocar. Mas tu sabes. Se eu toco e me diz pára. Se eu toco e não me toca. Porque me é mais fácil não tocar. Porque se não tocar. É que se não tocar não sou rejeitado. E se não for rejeitado não sofro. Percebes. Não. Tu não percebes. Porque se não me quer. Excrucior. Tenho medo. Tenho medo outra vez. Tanto medo.

E não passo disto. Olhar amar não tocar. Um dia toquei-te. Lembras-te. E tu riste. E eu fiquei tão vermelho. Tinha bebido. E depois cruzámo-nos na pista de dança. Eu tinha ido buscar mais um copo. Abracei-te com tanta força. E dei-te um beijo na cara. Naquele momento a minha vida parou. Porque era tudo o que eu queria. Ter-te nos meus braços. Não era o beijo. Não era o calor do teu corpo apertado contra o meu. Porque eu não sou corpo. Tu sabes. Eu não sou carne.

Ter-te nos meus braços. O teu ser no meu. A minha vida parou naqueles momentos em que te senti tan cerca tan cerquita de mi. Y no me lo pude evitar. Porque te. Y entonces te miré en los ojos y te pregunté si te enfadaras. Que no pasaba nada me dijiste. Pero sí. Había pasado algo. A mi se me había pasado algo.

E agora não sei. Já não sei nada. Sabes. Há dias assim. Tão belos. Que não queremos acabem nunca.

Te quiero tanto te echo tanto de menos.
André

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