Não leves para o teu frasco negro de ferro nada senão cinzas. As tuas. Não leves remorso nem culpa nem mágoa. Nem esperança. Nem medo. Nem amor. Nem dor. Não te leves. Só as cinzas. As tuas.
Não há tristeza a pingar dos meus olhos. Porque eu não tenho olhos. Nem tristeza. Nem amor. Nem dor. Mas chorei. Flebam amarissima contritione cordis mei. Sem soluço nem lágrima. E cada dia te via mais longe. E estendia-te a mão e tu davas-me as costas. As tuas. Já perdoei. Já esqueci. Ainda que me lembre todos os dias. Os meus dias. Que não são dias.
Não escrevas mais que me deixaste. Não escrevas mais que te arrependeste. Não escrevas mais que não me deste o tempo de que eu precisava. Não escrevas mais que aquilo que pensaste ser amor. Não escrevas mais que eu sabia. Não escrevas mais que foste cego como o maior dos cegos. Não escrevas. Não escrevas mais. Porque agora já não dói. E eu não estou. Nem sou. Não escrevas mais.
Não há tristeza a pingar dos meus olhos. Porque eu não tenho olhos. Nem tristeza. Nem amor. Nem dor. Mas chorei. Flebam amarissima contritione cordis mei. Sem soluço nem lágrima. E cada dia te via mais longe. E estendia-te a mão e tu davas-me as costas. As tuas. Já perdoei. Já esqueci. Ainda que me lembre todos os dias. Os meus dias. Que não são dias.
Não escrevas mais que me deixaste. Não escrevas mais que te arrependeste. Não escrevas mais que não me deste o tempo de que eu precisava. Não escrevas mais que aquilo que pensaste ser amor. Não escrevas mais que eu sabia. Não escrevas mais que foste cego como o maior dos cegos. Não escrevas. Não escrevas mais. Porque agora já não dói. E eu não estou. Nem sou. Não escrevas mais.
Não lances os teus olhos nos meus. Não me digas o que não me pudeste nunca dizer. Não me digas que. Porque agora é tarde. Agora passou. Não te agarres a mim morto. Não te deixes lançado desesperado sobre a minha sepultura. Porque eu morri. Eu não estou. Eu não sou. Eu sou duro. Tu sabes. Eu disse-te sempre tudo o que me ia no coração. Quase tudo. Porque havia coisas. Mesmo quando te doía. Nunca te disse aquilo que querias ouvir. O que não querias e o que não podias. Porque eu. Deixa estar.
Eu não quero estar sozinho no teu coração. Eu queria. Eu sei. Ainda no outro dia te dizia que queria. Mas já não quero. Porque tens o coração tão frio. Está tão frio. Estás tão frio. Não há sangue no teu coração. Para mo dares só a mim arrancaste e sangraste. E eu não quero coração frio arrancado sangrado. Queria deixar-me abraçar no teu corpo quente. Voltar a deitar a cabeça no teu colo. Sentir o teu calor. Porque aqui está tanto frio. E tu estás ainda mais frio.
Eu quero o teu desconforto. Sempre quis. E tu não viste. E quem não quer o teu desconforto não te merece. Mete isso na tua cabeça coberta de cãs. Estás bonito. Mais do que eras. Não tenhas medo da idade. Não tenhas medo do tempo. Porque não é o corpo que te vale. Tu não és corpo.
Adoro-te
Ρ.Α.
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Imagem:
Moralia in Iob de Gregório Magno - manuscrito francês do século XII
Eu não quero estar sozinho no teu coração. Eu queria. Eu sei. Ainda no outro dia te dizia que queria. Mas já não quero. Porque tens o coração tão frio. Está tão frio. Estás tão frio. Não há sangue no teu coração. Para mo dares só a mim arrancaste e sangraste. E eu não quero coração frio arrancado sangrado. Queria deixar-me abraçar no teu corpo quente. Voltar a deitar a cabeça no teu colo. Sentir o teu calor. Porque aqui está tanto frio. E tu estás ainda mais frio.
Eu quero o teu desconforto. Sempre quis. E tu não viste. E quem não quer o teu desconforto não te merece. Mete isso na tua cabeça coberta de cãs. Estás bonito. Mais do que eras. Não tenhas medo da idade. Não tenhas medo do tempo. Porque não é o corpo que te vale. Tu não és corpo.
Adoro-te
Ρ.Α.
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Imagem:
Moralia in Iob de Gregório Magno - manuscrito francês do século XII
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